terça-feira, 9 de maio de 2017

O cancelamento das eleições de 2018: entre o boato e a possibilidade


Deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) instalou uma comissão especial no Congresso para votar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 77A/2003, apresentada pelo deputado Marcelo Castro (PMDB-PI) – que prevê o fim da reeleição e a coincidência de mandatos
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
por Erick da Silva 
Mesmo descartando temporariamente a hipótese de um golpe, a comissão ainda sim é temerária. No mínimo devemos ligar o sinal de alerta
Em meio a turbulência e instabilidade política que assola o Brasil, o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao instalar uma comissão especial no congresso para votar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 77A/2003, apresentada pelo deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), que prevê o fim da reeleição e a coincidência de mandatos e de eleições, reacendeu, na quinta-feira (04/05), o debate sobre o temor de um movimento para o cancelamento das eleições de 2018.
Rapidamente se espalhou pela rede o sinal de alerta que tratava-se de uma manobra legislativa que poderia ter como consequência a suspensão das eleições no próximo ano e a prorrogação do mandato de Michel Temer até 2020, no chamado “golpe dentro do golpe” ou golpe 2.0. Poucas horas após a repercussão ganhar corpo e tentando “acalmar aos ânimos”, o deputado Vicente Cândido (PT-SP) - um dos mentores da instalação dessa comissão na Câmara que debaterá reforma política - "esclareceu" em nota - absolutamente hermética – que, na verdade, não seria bem assim (ou não, como diria Caetano).
Sem afirmar de maneira clara e contundente que tal manobra não existira (até porque, ao que parece, ela de fato existe!), ele deixou escapar que um verdadeiro "Frankenstein" antidemocrático está sendo parido nesta (contra)reforma do sistema político. Além da confusa simultaneidade de todas as eleições, falam na ampliação do mandato dos senadores para 10 anos, ampliação dos demais para 5 anos (mas sem reeleição), e a pior de todas as "novidades": a adoção do voto distrital.
 Pontualmente, sobre as eleições de 2018, haveria um “acordo de cavalheiros” para aprovação de uma emenda colocando a simultaneidade das eleições apenas em 2022. Após a nota do deputado Vicente Cândido, toda a grande mídia vinculou notícias apontando que o cancelamento das eleições de 2018 não passaria de um boato da internet, uma “fakenews” que não deveríamos dar credibilidade. Uma parte da esquerda rapidamente abraçou esta versão, tranquilizando-se frente uma ameaça de tempestade que não se consumou.
O céu brasileiro segue em brancas nuvens e a as instituições, seguem funcionando. De fato, tal como está o texto da PEC, a simultaneidade nas eleições para todos os cargos majoritários, provocando cancelamento das eleições em 2018, não está claramente colocado. Mas trata-se de uma PEC antiga e com datas de implementação já caducadas, podendo ser atualizadas para uma vigência imediata, mesmo que ao arrepio da legalidade.
Afinal, qual seria a razão que levaria os “nobres” deputados a ressuscitarem uma PEC de 2003, com admissibilidade já aprovada? A única razão é a pressa para uma rápida implementação das mudanças. Mas tal pressa para tratar de um regramento que entraria em vigor só em 2022, deixam as coisas um pouco mais nebulosas. Ainda mais se lembrarmos que, como efeito “colateral”, o adiamento das eleições garantiria mais dois anos de mandato (e foro privilegiado) para um parlamento com tantos relacionados na Lava Jato.
Pelo comportamento do legislativo neste ano, formalidades previstas pela letra fria da Lei estão em suspensão. Para não falar na votação da destituição da presidenta Dilma Rousseff, como esquecer, por exemplo, que esse parlamento é presidido por um deputado que afirmou que não concorreria a reeleição, pois o regimento da causa impedia isto, e no entanto, Rodrigo Maia assim o fez? Ou ainda o golpe regimental que permitiu a aprovação da lei das terceirizações? Com um congresso e um governo com baixa legitimidade, buscando salvar-se através de uma agenda impopular de retirada de direitos, cujos símbolos maiores são a aprovação do fim da CLT e a Reforma Previdência, em uma situação de aprofundamento da crise, por mais impopular e aparentemente improvável que possa parecer um golpe deste tipo, ele não pode ser por completo descartado.
Ainda não é possível prever se essa Reforma será de fato votada e o seu alcance, mas, de forma preliminar, podemos já afirmar que esta movimentação legislativa garantiu uma nova carta na manga, que poderá, em uma situação de emergência, ser acionada. Mesmo descartando temporariamente a hipótese de um golpe, a comissão ainda sim é temerária, pois qualquer mudança no sistema eleitoral, sem debate com a sociedade e na velocidade que pretendem promover mudanças, terá o objetivo de promover um fechamento ainda maior do regime político brasileiro e a perpetuação desses grupos políticos no poder. No mínimo devemos ligar o sinal de alerta.
 * Sócio desde 2016
Fonte: Carta Capital

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